sexta-feira, 3 de junho de 2011

Ex Prefeito de Guarulhos escreve sobre a descriminalização das drogas

“Crimes podem ser ou não ser, conforme a relatividade dos costumes”   

Você se lembra de que durante mais de um milênio emprestar dinheiro a juros (então chamada usura) era crime? Lembra-se quando no Brasil Colônia produzir manufaturas era crime, pois Portugal tinha uma visão de que o Brasil era um lugar apenas para ser explorado? Lembra-se que naquela época criticar o rei era crime de traição, como blasfemar era também crime? Lembra-se que professar outras crenças religiosas que não fosse a estrita observância dos dogmas católicos era crime e que por esta razão muitos foram condenados, como Lutero, Calvino, e milhares pereceram na fogueira da Inquisição? Lembra-se que quando Galileu disse que a Terra girava ao redor do Sol e não o contrário, como a religião afirmava, ele teve que renegar suas ideias sob pena de prisão ou morte? Lembra-se que na Alemanha hitlerista ser judeu era crime? Lembra-se que até recentemente era crime uma mulher manter relações fora do casamento (o adultério)?
Nem tudo que é crime hoje será crime amanhã. Há um núcleo duro do crime que atravessa e atravessará incólume milênios, o homicídio, o roubo, o estupro e alguns outros. Fora estes, os outros crimes podem ser ou não ser, conforme a relatividade dos costumes, das concepções predominantes na sociedade, dos interesses dos que detêm o poder, seja político, seja econômico, seja religioso, seja midiático.
O atual debate, que timidamente se inicia na sociedade brasileira, sobre a descriminalização das drogas não é novidade no mundo. Vários países já avançaram muito nisso, e não aconteceu nenhuma tragédia lá. Inclusive entre estes países está o nosso irmão mais velho, Portugal. Um país de povo aparentemente conservador e tradicionalista, que respira uma relação reverencial com sua densa história, tem demonstrado, pela sua maioria, posições muito abertas e arejadas nestas questões. Não é o que ocorre normalmente nos países sob influência predominante dos Estados Unidos, onde a postura é criminalizar ao máximo, prender ao máximo. No Brasil, ainda sob enorme influência da cultura norte-americana, o Poder Judiciário proíbe até passeata a favor da descriminalização da maconha, e a Polícia Militar reprime com cassetete e balas de borracha.
Até o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o ex-secretário geral da ONU, Kofi Annan, o ex-presidente do banco Central norte-americano, Paul Volcker, o ex-candidato a presidente do Peru, o escritor Mário Vargas Llosa, os ex-presidentes da Colômbia e do México, Cesar Gaviria e Ernesto Zedillo, mais outros ex de corte conservador na política, reuniram-se numa comissão mundial que defende alterações na política sobre drogas. É hora da sociedade progressista entrar mais firme para romper tabus.

Elói Pietá

O Texto original encontra-se na página do jornal "Diário de Guarulhos"

Elói Pietá, Profesor e Advogado é ex prefeito de Guarulhos, ex vereador e ex deputado, casado com a deputada federal pelo PT de São Paulo, Janete Pietá, é atualmente Vicê Presidente da Fundação Perseu Abramo.


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