sexta-feira, 30 de março de 2012

Como fazer uma Marcha da Maconha na sua cidade

Por Sergio Vidal,
postado originalmente no site do CannaCerrado e marchadamaconha.org

A Marcha da Maconha é um evento que acontece todos os anos em diversas cidades ao redor do mundo desde 1999. Na primeira, em Nova Iorque, a Marcha também sofreu repressão policial. Os agentes fecharam alguns portões do Central Park, tentando impedir a entrada dos manifestantes. A Marcha contornou o parque por fora e usou outra entrada para ter acesso ao local marcado para a concentração final da manifestação. Desde então, em cada país do mundo, em cada cidade, a Marcha tem tomado formatos, conteúdos, ritmos diferentes, de acordo com a cultura de cada localidade. Ao longo desses 13 anos de mobilização, centenas de cidades já produziram suas próprias versões da Marcha da Maconha e, no Brasil, esse movimento vem crescendo a cada ano.
Mas a ideia desse texto não é trazer um histórico das Marchas, é tentar incentivar as pessoas não apenas a participar das Marchas que ocorrerão em suas cidades, mas estimulá-las a se envolver com a organização das manifestações e, nas cidades onde não há organizadores, começar a produzir suas próprias Marchas. Na grande maioria das cidades brasileiras não existem coletivos organizando o evento. Aliás, na maior parte das cidades não há coletivos fazendo qualquer tipo de ação relacionada com a luta pela legalização. No entanto, esse é um movimento que precisa crescer, pois só assim chegaremos a um ponto de informação na sociedade no qual não haverá outra saída a não ser regulamentar.
No começo do texto trouxe o exemplo da diversidade desse evento para tentar deixar bem clara uma ideia que muitas vezes fica pouco explicita: A Marcha é um movimento social bastante plural, marcado principalmente pela liberdade e autonomia que os coletivos locais em cada cidade têm para criar, produzir e definir tudo relacionado ao formato e conteúdo das suas manifestações. Em algumas cidades as pessoas optam por simplesmente nomear o grupo organizador de “Marcha da Maconha (nome cidade)”, mas na grande maioria diversos coletivos tem se preocupado em produzir não apenas a Marcha, mas atuar em outras formas de ativismo e organização pró-legalização.
No Brasil, desde as primeiras Marchas no início da década de 2000 que essa autonomia tem sido respeitada por todos os envolvidos. Houve épocas em que cada um realizava a manifestação na data do ano que desejasse e nem sequer colocava o nome de Marcha da Maconha. De uns tempos para cá, com o maior diálogo entre diferentes movimentos que organizam o evento, foi sendo definido uma certa identidade visual que unificasse, de certa forma, todos os que desejam se manifestar nesse espaço anual suas ideias sobre a legalização da maconha. Além disso, foi se convencionando que maio é o mês ideal para iniciar o ciclo de manifestações, para se alinhar ao calendário tradicional internacional. Hoje em dia as Marchas começam em Maio, mas têm se alongado pelos meses subsequentes, de acordo com a particularidade cultural e necessidade de cada coletivo de ativistas.

Mas, o que é necessário, na prática, para se realizar uma Marcha da Maconha?
Pessoalmente, considero muito importante que todas as pessoas que usam maconha e/ou outras drogas se organizem de forma coletiva, se institucionalizem e promovam diversas ações relacionadas ao tema, não apenas a Marcha da Maconha. Mas sei que esse é um processo demorado, lento, requer reunião de pessoas, comprometimento, engajamento com a causa e, principalmente, fazê-las acreditar que a melhor forma de manter-se protegido dos abusos da lei é ser um ativista.
No entanto, o tema aqui é somente a Marcha. Falarei da importância das Associações em outro momento. Para aqueles que desejam ver a Marcha acontecendo na sua cidade, os requisitos são relativamente poucos. A Constituição é clara, nos dá direito à livre manifestação. A Decisão do Supremo Tribunal Federal também é muito clara, e decidiu que as Marchas são manifestações legítimas. Dito isso, é importante destacar que não é preciso qualquer tipo de autorização para realizar a manifestação. Mas é importante informar aos órgãos competentes a realização do evento, para solicitar sua ajuda na promoção de um evento público, pois essa é a praxe de todos os eventos públicos, incluindo manifestações, festas, comícios, etc.
É preciso produzir um Ofício em nome do Coletivo organizador do evento informando data, hora e o percurso marcados para a realização da Marcha. É necessário protocolar esse Ofício no Comando de Policiamento da Capital da Polícia Militar da sua cidade, e no órgão responsável pelo gerenciamento do trânsito. É importante protocolar tais documentos para que você tenha uma prova de que esses órgãos foram avisados da realização do evento. Em 2008 e 2009, época em que participei da organização da Marcha em Salvador, também achamos de bom tom informar à Vara da Infância e Juventude, à Delegacia responsável pelo policiamento na região da Marcha e à Delegacia de Tóxicos e Entorpecentes, mas não são obrigatórios. Esse ano, estou sugerindo esse trabalho aqui também em Aracaju, cidade onde moro.
Esse processo é importante não apenas para cumprir a burocracia normal de qualquer evento público, mas para mostrar a boa vontade dos ativistas, que são cidadãos comuns, lutanto por seus direitos, abertos ao diálogo com os poderes públicos.
Feito esse papel importante de informar às autoridades, resta agora prepara uma festa bonita para a data marcada. É importante arrecadar dinheiro para financiar algumas estruturas mínimas para fazer uma manifestação bonita, como carro de som, faixas, cartazes, máscaras, fantasias, dentre outras formas de manifestação visual. É legal produzir panfletos para distribuir a todos durante a marcha, com mensagens informativas sobre a cannabis, a Lei, a luta política, ou outro tema que ache interessante. É possível usar estratégias como as “vaquinhas” nas reuniões preparatórias; promover rifas; realizar festas em parceria com grêmios estudantis e Diretórios Centrais de Estudantes; Produzir camisetas, adesivos, etc
Uma forma barata de produzir materiais são as Oficinas de Arte-Ativismo, nos quais as pessoas levam cartolinas, papéis, tintas, lápis de cor, tesoura, espuma e se reúnem em algum local para confeccionar. Essas reuniões são muito importantes pois em geral dá para se produzir muito mais coisa do que cada pessoa é capaz de portar na Marcha e muitas pessoas não levam nada, assim é possível garantir uma manifestação bastante colorida, diversa, que passe uma imagem positiva para a sociedade.
Espero que com essas reflexões tenha ajudado a desmistificar um pouco o funcionamento da organização da Marcha da Maconha. Na prática, qualquer um pode promover a Marcha na Maconha na sua cidade. Não dá para esperar que alguém venha de fora e traga a Marcha, vocês são a Marcha! Nós TODOS somos a Marcha, ela está aí, passando na sua frente, você vai se jogar na rua ou vai ficar em casa?
Maio está chegando e ainda temos muitas semanas pela frente. Se uma vez por semana você tirar um dia para se reunir com as pessoas num local público ou fechado, certamente daqui até maio não só terá protocolado os Ofícios, mas também terá um monte de coisa bonita para mostrar na rua!
E se na sua cidade já está rolando um coletivo organizando a Marcha, ou você vai começar um, não esqueça de usar o fórum da Marcha – http://www.marchadamaconha.org/ – para discutir alguns temas, chamar a turma para as reuniões, e, principalmente, marcar a data. Uma data da Marcha só entrará na lista do site quando ela é tornada pública e no fórum da Marcha. Cada cidade tem um subfórum para discutir seus temas, se sua cidade não está no fórum é só enviar um e-mail que o espaço será criado, ou se você precisar de qualquer outra ajuda escreva! contato@marchadamaconha.org
Se você precisar também é possível criar uma conta de e-mail suacidade@marchadamaconha.org e também um conta para postar no blog da Marcha as informações sobre como está a mobilização por aí.

_____________________

Um abraço e até semana que vem!

Esse texto pode ser reproduzido desde que citada a fonte e o link original.
* Sergio Vidal é antropólogo e autor do livro Cannabis Medicinal – Introdução ao Cultivo Indoor (http://cultivomedicinal.com.br/) e de diversos artigos sobre drogas, seus usos e usuários. É conselheiro do Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas – CONAD. Atualmente também é pesquisador do Núcleo de Estudos sobre Substâncias Psicoativas -NEIP (http://neip.info/). Escreve coluna semanalmente, no site do Cannacerrado, em que aborda temas de relevância social e política. Envie sugestão de tema para as próximas colunas: sergiociso@gmail.com

Nenhum comentário:

Postar um comentário